Sunday, December 06, 2009

1/3

Suavemente a estranho. Aquela noite. Cheirava. O barulho ensurdecedor do projector directamente apontado aos meus olhos. Eras um vulto. Naquela noite. Amargo, o ar parecia abater-se nos meus ombros. Como que juntando-se às tuas palavras no golpe derradeiro para me atirar janela fora. 2/3 de mim no chão, a tua parte, a nossa parte em mim.
Que vou eu fazer só com 1/3?
O canino resistente mais saliente. Vampiro! Gritavas tu num tom de enxofre como se tudo o que alguma vez te dei fosse um círculo de chamas que tinhas finalmente conseguido saltar. O barulho ensurdecedor do projector directamente apontado aos meus olhos a não me deixar sentir as lágrimas que em cascata caíam do teu. Do lado esquerdo.
Apenas do lado esquerdo.
A delicadeza da despedida ensaiada. A envolver-me. A apertar o remanescente da minha pessoa. Mais. E com mais força. E a dor putrefacta que eclodia de cada palavra vomitada por ti. Ecoava nos meus ouvidos com vontade de me ensurdecer. Como o projector que me afastava de ti. Impedindo o único olho que me deixaste ficar de comunicar com os teus olhos, entrar na tua cabeça, descer ao teu coração e revelar-te que também tu já não eras vampiro o suficiente, que os 2/3 de ti de que abdicavas levariam consigo a vida doce com cheiro a mel. Também estás reduzido a 1/3, não estás?
Estás, não estás?
Leva-me tudo menos o sabor de um silencioso saudosismo verdadeiro com cheiro a música. Deixa-me ficar aqui. Em modo espera. Esperançoso. Até ao dia em que o projector se funda e o feixe de luz que te impede de atravessar. Eu sei que é apenas isso que te impede de atravessar. Desapareça.

1 comment:

Nica said...

Sabes quando o desgaste é tão grande que até o repousar te cansa? Isso é quando nem 1/3 de ti mesmo te sobra... pior é se não acreditas que poderás oferecer outra vez nem 1/2...
(bem ainda bem que não somos dessas pessoas.. ;)..)