Palavras

Hoje não saí. Podia, devia ter saído, mas não saí. Perdi-me nas tuas palavras. Só parei no início. Não sei se te quero ter conhecido mais cedo ou se simplesmente não te quero ter conhecido. Não me consigo decidir. Foi quase a mesma sensação de estar sentado em frente à televisão a ver um filme ou um qualquer reality show. Senti-me mal por te estar a ler, por estar a invadir a tua vida, a tua intimidade, os teus pensamentos, sentimentos, emoções. Será que me podes ajudar? Não me queres ajudar? Saí, apesar do adiantado da hora. Não me conseguia concentrar e tinha de entregar um trabalho no dia seguinte. Sentei-me ao volante a conduzir sem direcção, as tuas palavras a ecoar na minha cabeça. Decorei algumas passagens e atribuí-lhes a memória da tua voz. Levei o portátil. Passei pela praia e decidi parar. Sei que não me vais ajudar. Sei que estou sozinho nesta decisão. Pela primeira vez, obrigam-me a escolher. Sentei-me a escrever o tal trabalho, as tuas palavras continuavam a preencher o vazio de sons que momentaneamente se fazia sentir enquanto me recordava de um pouco mais. Terminei já passava das oito. O sol tinha vencido a luta contra a escuridão. Pessoas passeavam à beira-mar. Questionei-me o que fazia as pessoas arrancarem-se tão cedo ao sabor quente da cama para deambularem-me por uma praia numa manhã de Inverno. Agradeci ter trazido a Internet móvel. Enviei o trabalho enquanto saboreava um último cigarro antes de regressar a casa, deitar-me na cama, ficar a ouvir-te na minha mente por mais uns minutos. Até poder descansar das tuas palavras.